10 de janeiro de 2011

Não pode por quê?


Hoje, na Fnac do Morumbi Shopping, fui abordado por um funcionário ao tirar uma foto, com o celular, da capa de um livro. Perguntei o motivo, ele disse que era um espaço privado e que era proibido tirar foto dentro da loja, e que se eu insistisse eu poderia ser abordado por um segurança (jeito fino de dizer que ele o chamaria). Eu expliquei que eu era apenas um cliente querendo guardar o nome de um livro para comprar depois, e que nesse caso eu certamente não o compraria na Fnac, e sim na Livraria Cultura.

Devo dizer que já tinha ressalvas em comprar livros, CDs e DVDs na Fnac, por um motivo muito simples: não ganho nada fazendo compras lá. Para pontuar no programa de fidelidade deles, preciso ter o cartão de crédito private label da Fnac. Eu não preciso nem quero mais um cartão de crédito na minha vida carteira, então prefiro fazer minhas compras na Livraria Cultura (de todas a minha preferida, pelo atendimento e ambiente) ou na Saraiva, onde só precisei fazer um cadastro para ter descontos e ganhar pontos (aliás, meu CD novo do Pato Fu saiu quase de graça na Saraiva com esses pontos).

Uma pechincha, e valeu cada ponto

Fiquei com essa pulga atrás da orelha e aproveitei, já que estava por perto, para atravessar a rua e ir à Livraria Cultura do Shopping Market Place pra saber como funciona por lá. Já tirei fotos de capas de livros lá dezenas de vezes, mas nunca me abordaram por causa disso. Fui perguntar para a mocinha do caixa e contei o que tinha me acontecido na Fnac. Ela disse que na Cultura também não podia, e que era uma questão de direito autoral do livro. Perguntei: Mas se eu comprar o livro, pode? Resposta: Aí pode, porque o livro é seu. Ela concordou comigo que isso era meio ridículo, mas que era assim.

Eu não sou advogado, mas se tem uma lei que eu conheço relativamente bem é a Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998 (eu não tive que pesquisar essa data, juro, decorei pra uma prova), pois como fotógrafo amador e pseudo-cineasta essa é uma lei que me afeta.

Esta confeitaria não entendeu bem o escopo dessa Lei

Eu não quis discutir com a mocinha do caixa porque ela parecia super ocupada, mas pelo que me consta os direitos de um livro (ou de qualquer obra) não passam a ser meus a partir do momento em que eu o compro. É apenas um exemplar. Ademais, a lei não considera ofensa aos direitos autorais "a reprodução, em um só exemplar de pequenos trechos, para uso privado do copista, desde que feita por este, sem intuito de lucro" (capítulo IV, artigo 46, inciso II - isso eu pesquisei, confesso). Nem era esse o caso: eu queria a imagem apenas para lembrar de ir atrás dele depois. Eu já tinha lido um livro do Martin Page (mentira, eu li metade, o livro sumiu, quem pegou?) e fiquei interessado em ler outro.

Reprodução seria, digamos, postar a tal foto do livro aqui.

Eu não queria reproduzir, eu queria apenas ter. Vocês podem dizer: por que você simplesmente não anotou o nome do livro e do autor? Eu respondo: porque eu tenho preguiça e um celular com câmera. E pra mim câmera de celular não é boa o suficiente pra tirar fotos de verdade, então eu a uso quase que exclusivamente pra registrar coisas e lembrar depois. Tiro foto de receita pra não ter que copiar à mão, ok?

E eu só reproduzi a capa do livro aqui por birra, e porque esse blog não tem fins lucrativos. (Aliás, perceberam que eu tirei os anúncios do Google? Se vocês soubessem a grana que eu estava ganhando com eles, teriam ficado com pena e clicado obsessivamente em cada um)

Pronto, agora vocês sabem.

Para me garantir, perguntei para meu primo, que é sócio de uma editora, se uma editora (que é quem detém os direitos sobre a obra) se importa com isso. Ele disse que não, que juridicamente não há violação dos direitos, e que mercadologicamente a editora acha ótimo que se divulgue a capa dos seus livros.

Então a explicação da moça simpática do caixa da Livraria Cultura não procede. A mesma explicação eu recebi, via Twitter, de uma amiga e ex-funcionária da Fnac:


Não tirei foto da loja e o argumento não se aplica ao produto. A única explicação que me restou, ainda que frágil, foi a que meu primo me passou: alguns comerciantes criam estas restrições para evitar que as fotos de seu estabelecimento cheguem às mãos dos seus concorrentes, e eles possam analisar a disposição e a variedade dos produtos, e com isso roubar a vantagem competitiva deles. Considerando que um concorrente pode entrar livremente na loja, acho que a Fnac (e qualquer outro comerciante) tem mais a perder ao constranger um cliente do que se cancelasse essa proibição.

Mas também não tenho certeza se é esse o problema. Escrevi para o SAC das duas livrarias para perguntar qual é o motivo disso. Se eu receber uma resposta, publico aqui. Escrevi também para a Rocco, que é a editora do livro, para saber o que eles pensam.

Como disse a Flavita, "ai, essas lojas de 1900". Eu não pensei que fosse o caso destas duas livrarias. As duas têm aplicativos para iPhone que permitem ler o código de barras dos produtos da loja, e para isso é preciso, pasme, tirar uma foto (ainda que app o da Fnac só esteja disponível na França e que o da Livraria Cultura, mesmo depois da atualização que prometia resolver o problema, ainda tenha um bug que impede essa funcionalidade no meu aparelho). E ainda tem o Google Goggles, funcionalidade recém lançada para o iPhone (acho que já existia para Android) que permite fazer buscas a partir de imagens (livros, obras de arte, logos, etc). A tecnologia tenta facilitar a nossa vida, a irracionalidade segura.

Update 17/01:

Recebi a resposta da Fnac.
Prezado Sr. Antonio,
Informamos que seu comentário foi encaminhado ao departamento responsável, desde já agradecemos por seu comentário, pois é através de críticas e sugestões que podemos melhorar nosso atendimento.
Andréia Silva
Atendimento – fnac.com.br
 Minha réplica:
Bom dia, Andréia,
Obrigado por encaminhar a minha mensagem aos responsáveis. Aguardo a resposta deles.
Antonio
Resultado:
This is an automatically generated Delivery Status Notification.
Delivery to the following recipients failed.
      atendimento@fnac.com.br
Eu meio que já esperava isso. Como consumidor, é extremamente frustrante enviar uma solicitação/questão/pergunta específica para uma empresa e receber uma resposta genérica e evasiva. Concordo em enviar a mensagem para o departamento responsável, mas gostaria que o atendimento continuasse com eles. Na teoria do atendimento ao consumidor, o SAC faz o atendimento em si, intermediando a comunicação com os demais departamentos. O cliente não quer saber se a sua pergunta chegou à pessoa certa; ele quer saber a resposta. Vou tentar novamente pelo site.

Update 03/02:

Recebi, em 18/01, a seguinte resposta da Fnac:

Prezado Sr. Antonio,
Encaminhamos seu e-mail ao reponsável da loja para análise e pedimos por gentileza para aguardar um retorno.
Atenciosamente,
Elaine de Oliveira
Atendimento – fnac.com.br

Até o momento, não recebi o retorno prometido.